EDIÇÃO
CONJUNTA BRASIL-PORTUGAL 200
ANOS DE INDEPENDÊNCIA BRASILEIRA
Em 7
de setembro de 1822, às margens do rio Ipiranga, próximo a São Paulo, ressoou o
famoso grito: “Independência ou Morte”. Este foi o anúncio simbólico do passo
decisivo na construção do Brasil como nação independente. Sob a égide da ainda
reinante Casa de Bragança, Pedro, até então Príncipe Regente, assumiu a
liderança política que lhe havia sido implicitamente conferida pela nação
brasileira, que, em janeiro daquele ano, ouvira e ecoara sua não menos famosa
grito de “eu vou ficar”. Ao declarar sua intenção de ficar, opondo-se assim ao
apelo dos Tribunais Constituintes reunidos em Lisboa, Pedro adotou o Brasil
como sua casa, pronto para sua ascensão natural à liderança de um novo império
separado de sua pátria. Sua proclamação como imperador ocorreu logo depois, em
12 de outubro de 1822. Como figura tutelar, foi fundamental na manutenção da
unidade política de um vasto território, bem como na formação das instituições
sociais e políticas do Estado brasileiro em construção. Pedro I do Brasil
regressou a Portugal em 1831 como Pedro IV para apoiar a causa liberal, que lhe
era cara, numa altura em que a turbulência inerente ao regresso à monarquia
absoluta era muito maior do que a ligeira perturbação sentida na política brasileira.
vida em busca de seus horizontes.
Muitos
se envolveram na construção dessa trajetória irreversível iniciada naquele
vertiginoso ano de 1822. Entre os muitos protagonistas que, nas províncias
brasileiras, manifestaram seu desgosto com a manutenção da administração e dos
poderes coloniais, a liderança firme e calma do Destaca-se José Bonifácio de
Andrade e Silva. Foi responsável por redigir documentos programáticos que foram
decisivos para afirmar as potencialidades do país emergente, além de influenciar
Pedro a aderir à causa brasileira.
Em
Portugal, às vésperas de 7 de setembro, os Tribunais davam os retoques finais à
Constituição, que ainda dedicava uma seção específica à organização do poder
executivo do Brasil. Ao mesmo tempo, os Tribunais discutiam disposições
relativas às relações comerciais entre Portugal e o Brasil como partes do mesmo
império, com fortes opiniões expressas sobre as vantagens de (ou a ofensa
causada) a retomada de privilégios que protegiam a exclusividade do antigo
mercado colonial. No entanto, essa possibilidade não passava de uma miragem.
De
fato, embora seja verdade que a independência política brasileira decorreu de
desejos convergentes de emancipação e libertação do antigo poder dominante, não
há dúvida de que a legitimação de um tão desejado processo de separação
política foi em grande parte ditada pela crescente autonomia económica que o
território brasileiro alcançou a partir de 1808, quando a corte do futuro João
VI se instalou no Rio de Janeiro em decorrência das guerras napoleônicas. A
abertura dos portos brasileiros à poderosa marinha mercante britânica
representou o fim de uma era de exclusividade colonial que tornou o Brasil
capaz de alcançar sua liberdade econômica, ainda que para isso tivesse que se
posicionar sob a influência de outras forças estratégicas internacionais.
interesses. Mas a sorte estava lançada. A união entre Portugal e Brasil foi
enfraquecida em seu elo mais forte. O descontentamento no reino agitou
sentimentos que vieram a encarnar o movimento liberal regenerador,
consubstanciado na revolução de 1820. Bastou dois anos para que a inevitável
independência do Brasil se confirmasse de uma vez por todas.
José
Luis Cardoso
Instituto
de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa
Emissão / issue - 2022 / 09 / 07
Selo / stamp: €2,75 - 75 000
Design: Ely Borges, Isabel Flecha de Lima
Adaptação / adaptation:
Unidesign / Hélder Soares
Créditos / credits
Em cima / above:
Sessão do Conselho de Ministros.
Óleo sobre tela, Georgina Moura Andrade de Albuquerque, 1922. Coleção/collection: Museu Histórico Nacional / Ibram/ MTur / n.º 03 / 2022 / MUS. Em baixo / below:
Retrato do Imperador Dom Pedro I. Óleo sobre tela, Simplício Rodrigues
de Sá, 1826. Coleção/collection: Museu Imperial / Ibram / MTur/ n.º 03 / 2022 / MUS.
On 7 September 1822, on the banks of the river Ipiranga, near São Paulo, the famous cry
rang out: “Independence or Death”. This was the symbolic announcement of the decisive step in the construction of Brazil as an independent nation. Under the aegis of the still
reigning House of Bragança, Pedro, until then Prince Regent, assumed
the political leadership that had been implicitly bestowed on him by the Brazilian nation, which, in January that year, had heard and echoed his no-less famous cry of “I will stay.” By declaring his intention to stay, thus opposing the appeal of the Constituent Courts gathered in Lisbon, Pedro adopted Brazil
as his home, ready for his natural
ascent to leadership of a new empire separated from its motherland. His proclamation as emperor took place soon after, on 12 October 1822. As a tutelary figure,
he was fundamental in maintaining the political
unity of a vast territory, as well as in shaping
the social and political institutions of the Brazilian
state under construction. Pedro I of Brazil returned to Portugal in 1831 as Pedro IV to support the liberal cause, which was close to his heart, at a time when the turmoil inherent in the return to an absolute monarchy
was far greater than the slight
disturbance felt in Brazilian political life as it searched for its horizons.
Many were involved in the construction of this irreversible trajectory set in motion in that giddying year of 1822. Among the many protagonists who, in the Brazilian provinces, had expressed their disgust at the maintenance of colonial administration and powers, the firm and calm leadership of José Bonifácio de Andrade e Silva is worth highlighting. He was responsible for
writing programmatic documents that were decisive in affirming the potentials of the emerging country, as well as being influential in persuading Pedro to join the Brazilian cause.
In Portugal, on the eve of 7 September, the Courts were giving the finishing touches to the constitution, which still
devoted a specific section to the organisation of the executive power
of Brazil. At the same time, the
Courts discussed provisions relating to trade
relationships between Portugal and Brazil as parts of the same empire, with strong opinions expressed on the advantages of (or the offence caused by) resuming privileges protecting the exclusivity of the former colonial market. However, this possibility was no more than a mirage.
Indeed, while it is true that Brazilian political independence stemmed from converging desires for emancipation and freedom from the former dominant power, there is no doubt
that the legitimisation of a much-wanted process of political separation was in large part dictated by the growing economic autonomy that the
Brazilian territory achieved from 1808, when
the court of the future João VI settled in Rio de Janeiro as a result of the Napoleonic wars. The opening up of Brazilian ports to the powerful British merchant navy represented the end of an era of colonial exclusivity that made Brazil able to achieve its economic freedom, even if in order to do so it had to position
itself under the influence of
other international strategic interests. But the die had been cast. The union between Portugal and Brazil was weakened at its strongest
link. Discontent in the kingdom
stirred sentiments
that came to embody the regenerative liberal movement, consubstantiated in the revolution of 1820. Two years were all it took for Brazil’s inevitable independence to be confirmed once and for all.
José Luís Cardoso
Instituto de Ciências Sociais, University of Lisbon
Retirado de: https://www.ctt.pt/contentAsset/raw-data/b4847281-53ba-4d7a-a5b0-54560e7ad149/ficheiro/1007547c-9ffd-44cf-ab5b-63f01796fcce/export/PAGELA%20Brasil%20Portugal_TXT.pdf