O início do século XIX, em Portugal, foi marcado por uma conjuntura propícia à divulgação do
ideário liberal como solução regeneradora para
o país. As crises política e económica criaram
condições para a Revolução Liberal de 1820
e, naturalmente, para a convocação das Cortes
Constituintes, que se reuniram para aprovar
a primeira Constituição de Portugal.
Os Constituintes de 1821-1822, inspirados pelos
princípios da Revolução Francesa, da Constituição americana e especialmente da Constituição
espanhola de Cádis de 1812, fizeram desta a mais
marcante das constituições monárquicas, consagrando os princípios ligados aos ideais liberais da
época: soberania nacional, representação parlamentar, separação de poderes, igualdade jurídica e
respeito pelos direitos pessoais.
Os primeiros Deputados aprovaram a Constituição, mas não foi essa a única função que as Cortes desempenharam. Estas assumiram também
poderes políticos e legislativos ordinários, materializando, desta forma, a implantação da ordem
liberal. Foi neste quadro que se aprovou a absolutamente inovadora Lei da Imprensa, bem como
a abolição da Inquisição e a amnistia aos presos
por opiniões políticas.
As eleições para um mínimo de cem deputados,
havendo «para cada trinta mil almas um deputado»,
foram realizadas por sufrágio indireto e em várias
fases eleitorais, envolvendo Freguesias, Comarcas
e Províncias.
Assim se formou o primeiro Parlamento de Portugal – as Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação
Portuguesa – que reuniu, pela primeira vez, em
sessão preparatória, a 24 de janeiro de 1821, na
Sala da Livraria do Convento das Necessidades, onde se procedeu à verificação dos diplomas,
à legalização das pessoas e dos poderes de cada
um dos apresentados.
A primeira sessão das Cortes, realizada a 26 de
janeiro, continuou o trabalho de legitimação dos
deputados eleitos e, nas centenas de sessões que
se seguiram, o foco dos trabalhos foi a análise,
discussão e aprovação da primeira Constituição
de Portugal, tendo sido assinadas, a 9 de março
de 1821, as Bases da Constituição, que vigoraram
provisoriamente até à conclusão do texto constitucional definitivo.
Os dois exemplares da Constituição foram assinados pelos Deputados na sessão das Cortes de 23 de
setembro de 1822, tendo estes mesmos Deputados
feito o juramento do texto constitucional na sessão
de 30 de setembro de 1822. Alguns dias depois,
a 1 de outubro de 1822, decorreu o ato de aceitação
e juramento do Rei D. João VI à Constituição.
Os ideais liberais fomentados pela Revolução e
explanados na Constituição de 1822 transformaram o ordenamento do Estado e a organização
social. Os princípios monárquicos absolutistas
deram lugar ao princípio da soberania da Nação
e os súbditos passaram a ser cidadãos, gozando assim, pela primeira vez, os princípios de cidadania
e liberdade.
É por isso fundamental recordar, 200 anos depois,
com emoção e responsabilidade, o extraordinário
trabalho destes primeiros Deputados, sentindo
agora o nosso Parlamento herdeiro desses valores
e defensor dos princípios democráticos!
José Manuel Araújo
Diretor de Informação e Cultura da Assembleia da República.
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